Dia 8 para sempre
- Roberto Mendonça Maranho
- 25 de fev.
- 4 min de leitura
Atualizado: 25 de fev.
Maria, dentista, havia se mudado de Campinas para São José dos Campos havia dois meses. Alugara uma sala em uma clínica onde já atendia seus novos pacientes. Ainda estava se acostumando à nova cidade. Seus filhos, Celina e Jerônimo, ambos adolescentes, continuaram morando em Campinas com a tia, o que revelava uma nova realidade a ser gestada e sentida. Por isso, Maria viajava muito para sua antiga cidade para curtir bons momentos com os filhos.
Já Rodrigo, seu namorado, trabalhava na área de tecnologia da informação e vivia em Campinas. Desenvolvia seus projetos no esquema home office e trabalhava em casa. Com isso, tinha liberdade para viajar para São José dos Campos e passar uns dias com a companheira.
Próximo ao Carnaval, Rodrigo e Maria combinaram de passar duas semanas juntos na nova terra da dentista. E na viagem corria tudo bem: foram ao cinema, restaurantes, barzinhos, cozinhavam juntos, cuidavam do apartamento. Até que, num fim de tarde, resolveram ir a uma cafeteria no centro da cidade que possuia uma entrada estreita que dava acesso a um jardim secreto. No lugar serviam cafés, bebidas e comidas de alta qualidade. Maria e Rodrigo conversavam enquanto aguardavam seus pedidos.
Entre uma conversa e outra, falaram do Carnaval que se aproximava e Maria já havia compartilhado que passaria o feriado com seus filhos em São José dos Campos. Rodrigo entendeu a importância da namorada passar esse tempo com os filhos e estaria nesse período em Campinas com sua família. Tudo alinhado.
De repente, chegou uma mensagem de Celina no celular de Maria, dizendo que no final de semana do dia 8 de março iria viajar com seu irmão Jerônimo para a cidade do pai, pois era aniversário de uma grande amiga. Maria informou a posição dos filhos e teve a ideia imediata de fazer uma viagem com Rodrigo para celebrar o simbólico dia para ela. Além disso, era a oportunidade de um final de semana diferente, já que adoravam passear.
Rodrigo sempre respeitou a data e parabenizava as mulheres de sua família, mas confessou, no exato momento da alegria da namorada, não considerar a data importante. Inclusive, naquele instante, reagiu de forma rígida dizendo que preferia estar em Campinas nessa data, sem perceber a empolgação da namorada com a ideia da viagem.
Foi um balde de água fria para Maria, surpreendida pelas falas do namorado. Ela sempre deu muito valor ao dia em que é celebrada a luta das mulheres. Aliás, as lutas. Não se tratava, para ela, de parabenizações, mas de uma data de muitos valores. Ademais, se era um final de semana livre, seria uma ótima oportunidade para viajarem, conforme disse Maria no ímpeto. Maria se posicionou e depois economizou nas palavras.
As más compreensões levaram a um clima estranho, tentando cada um entender o que se passava na cabeça um do outro. Desarranjo? Sim. Acontece.
O tempo passou. Já eram quase dezenove horas e o passeio na cafeteria tinha se alongado mais do que o planejado. Maria tinha uma reunião com outros dentistas e era ela quem estava de carro. Logo, Rodrigo disse que pegaria um uber até o apartamento e a aguardaria lá.
Ao saírem, logo em frente a uma loja, Rodrigo estava com o celular na mão pronto para acionar o aplicativo, quando um carro parou em sua frente apenas com o motorista, que procurava pela pessoa que solicitou o transporte por aplicativo. Maria, que estava ao lado nesse momento, disse ao motorista que, se ele estivesse livre, Rodrigo precisava do serviço. Três minutos depois a suposta passageira não apareceu e o motorista do uber chamou Rodrigo para o carro e o levou até o apartamento de Maria.
Ao chegar, Rodrigo recebeu em seu celular um áudio dela, sugerindo que o namorado refletisse. Apresentou o que pensava e ressignificou para Rodrigo a data do Dia da Mulher. Evidenciou como era importante para ela e expôs que é a data em que se celebra a luta da mulher, lembrando de várias situações em que sentiu os estilhaços culturais pelo fato de ser mulher e o quão importante era viver esse dia em celebração e respeito frente às suas lutas. Havia simbolismo na data. Por essa razão, estava chateada pela quebra de expectativa que a situação na cafeteria gerou.
A partir disso, Maria deixou o diálogo aberto para que pudessem alinhar as ideias novamente, pois era comum que dialogassem e tentassem unir as pontas de cada um.
Rodrigo refletiu sobre tudo o que aconteceu e percebeu que, como a data era tão importante para sua namorada, passava a ser também muito importante para ele, até como uma forma de também vivenciar um dia de muitas marcas e também conquistas. Ele entendeu o significado e se apropriou da relevância.
Quando Maria chegou ao apartamento após a reunião, Rodrigo lhe fez uma proposta: que ela fosse até Campinas e, de lá, os dois seguiriam juntos para Holambra no dia 8 e dormiriam em um hotel, retornando para suas cidades no dia seguinte. Apresentou também uma segunda possibilidade: ele iria até São José dos Campos e de lá seguiriam viagem para alguma cidade próxima. Era importante estar com ela e ele queria isso.
Naquela noite, o casal deixou o assunto suspenso por algumas horas e conversaram normalmente sobre assuntos diversos. A impressão de Maria já se fazia diferente no momento em que ouviu a partilha dele.
Na manhã seguinte, Rodrigo escreveu um texto para Maria contando o ocorrido de forma honesta, o que ajudou ambos a processarem e entenderem o que sentiram. Maria sugeriu almoçarem num lugar que adoravam e decidiram não definir nada para o mencionado final de semana. Entretanto, enxergaram que todas as relações têm pontas que, às vezes, ficam soltas por um tempo, mas que não comprometem as coisas boas conquistadas. Compreenderam que algumas questões se resolvem no convívio, na partilha de outras coisas, enquanto tudo se encaixa e permite ao casal compreender que é necessário celebrar algumas datas e muitas lutas todos os dias.
Por que? Porque a vida passa depressa demais e deixa o presente para aprendermos juntos, ressignificarmos juntos. A relação deles é assim, repleta de simbolismos e, agora, da essência do dia 8.
(25/02/2025 – Roberto Mendonça Maranho e Ledys Aléxia Maia)
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